terça-feira, 5 de outubro de 2010

Esse foi o primeiro texto que escrevi após minha separação.

Minha alma é um Templo em ruínas, que oculta, por entre seus escombros, tesouros inimagináveis, e perigos impensáveis...
Por entre os escombros caminho eu... EGO fragmentado em dezenas de possibilidades, podendo ser tudo e nada ao mesmo tempo, tensão de opostos que lutam entre si o tempo todo... uma explosão, um Big-Bang anímico ou onírico, cuja força produz um universo complexo e inexplorado, que por questão de sobrevivência teimo em chamar de EU...
Houve tempo em que a palavra EU fazia algum sentido. Casa, família, trabalho, amigos, estudos, tudo isso formava um conjunto de qualidades, um bloco, uma construção, que se julgava monolítica, integrada, indestrutível... Mas que tolice! A única coisa indestrutível no mundo é justamente a “destrutibilidade” de todas as coisas! Hoje sei que sou apenas como um rio: embora quem me olhe todos os dias tenha a impressão de estar vendo algo familiar, o mesmo rio de ontem e de todos os dias, minhas águas nunca são as mesmas. Pena que isso quase sempre passe despercebido aos olhos do mundo.
Caminho por entre as ruínas desse Templo em busca de um tesouro... Não busco um tesouro qualquer, feito de ouro, prata ou pedras preciosas, mesmo porque eles se corroem com o tempo, enferrujam e perdem o brilho... Procuro por um objeto simples, tão simples quanto extraordinário: um espelho. Mas também não se trata de um espelho comum; procuro um espelho mágico, capaz de refletir não os traços e as marcas da idade de um rosto, mas os contornos, desenhos e rugas de uma alma, talvez já cansada de vagar pelo Cosmo pelos eons de tempo.
Mesmo sendo a mais tola das pretensões, resiste, numa obstinação tão louvável quanto inútil, uma esperança (ela não é só a última que morre: normalmente é também a primeira que renasce). Trata-se da esperança de que serei capaz de reconhecer a imagem que verei refletida nesse espelhinho mágico.
 A Esperança é um ser curioso. Aparece como uma espécie de mistura de fada-madrinha e súcubo, e não sei com qual dessas duas faces ela sussurra em meus ouvidos que esse Templo de minha alma pode ser reconstruído e voltar a ter exatamente a mesma forma de antes. Pensamento estranho: se Brahma refizer com exatidão o trabalho que Shiva tão cuidadosamente destruiu, isso não seria meramente a continuação de Maya? Lembremos a canção de um mestre: o grão morre para nascer trigo, e só morrendo o trigo nasce pão.
Do lado da Esperança surge uma outra criatura. Parece filha de Pandora, tem um senso de humor negro apurado, e atende pelo nome de Dúvida. Talvez ela venha a ser minha mais fiel companheira de caminhada por esses próximos dias. Tudo é tão novo, e mesmo as imagens antes familiares, quase atávicas, se vestem com novas fantasias, usam máscaras. E essas máscaras tanto provocam risos quanto assustam.
No fundo não sei quem tem razão, se Brahma, Shiva, ou nenhum dos dois. Mas de uma coisa tenho certeza: não sei que feição terá o novo Templo de minha alma, mas como pedreiro-livre, ou como carpinteiro do universo, ou carpinteiro de mim, alguma coisa precisa ser construída. Que face terá esse novo Templo?

2 comentários:

Daniella disse...

Simplesmente perfeito! A-D-O-R-E-I! Muito bacana a forma como escreve, sobre o que ecreve, a sua sensibilidade e percepção das coisas, da vida... Muito bacana! Legal demais! Grande beijo,Dani.

Anônimo disse...

Nossa que profundidade,um pensamento absoluto,ótimo!!!