sábado, 26 de novembro de 2011

... e FÉ. CAMINHANDO COM O TEÓLOGO...


          Amados leitores, depois de algumas postagens nas quais eu reuni frases minhas de cunho filosófico, postadas em redes sociais, eis que agora eu apresento uma coleção de frases de aspecto mais religioso, mostrando a minha face de cristão, um cristão que está buscando a Cristo, mas a um Cristo dissociado das igrejas e das invenções humanas. Espero que essa também seja uma leitura de proveito para todos. Então, depois do filósofo, vamos ao teólogo:

          A Bíblia é um livro extremamente falho em termos científicos, além de ser um poço de contradições. Mas o cristão de verdade sabe, como defendia Kierkegaard, que a Fé nos permite transpor os limites de nossa racionalidade, ainda que isso implique em risco. E nessa busca, se não tiver sua Fé sufocada pelas monolíticas instituições da Igreja, o cristão de verdade vai descobrir a Jesus, que nos diz que Deus, mesmo sendo o Ser Supremo, fez questão de se identificar com a miséria humana, e o fez puramente por AMOR.

          Para os católicos, o matrimônio é um sacramento, ou seja, a bênção do padre tem o poder de mudar a natureza da relação entre o casal, fazendo-a deixar de ser pecado. Os protestantes fazem ainda pior, conferindo esse poder sacramental a um contrato social inventado por homens, que apenas regulamenta direitos e deveres civis em uma sociedade que, pelo menos em teoria, é de natureza laica.

          Que pai exige que um filho sofra por toda a vida as consequências de uma escolha errada feita no passado? O Deus dos cristãos faz isso, ao não permitir que um casal que não mais se ama se separe. São filhos que pedem ao pai o pão, o peixe e o ovo da chance de reconstruir a vida e serem felizes, mas ganham a pedra, a serpente e o escorpião de um contrato social que os prende para o resto da vida (Lc 11: 11-13). Isso não tem nada a ver com o PAI que Jesus nos apresentou.

          Sobre o casamento, Jesus disse que o homem jamais deveria separar aquilo que Deus uniu. Mas em que parte da Bíblia está escrito que a assinatura de um contrato social, ou mesmo a bênção de um ministro religioso, são garantias infalíveis de que se trata de uma união efetuada por Deus?

          O Deus dos cristãos é esquisito: perdoa todo tipo de pecado, sem exigir nenhuma punição... só não perdoa o pecado de um dia na vida ter escolhido a pessoa errada para se casar. Para esse "pecado", Deus exige uma punição severa: ter que viver com essa pessoa, até que a morte de um dos dois liberte aquele que permanece vivo. Tão diferente do Deus de Amor que a tudo perdoa que nos foi apresentado por Jesus.

          São João Batista chama os fariseus (os "homens de Deus" da época) de "raça de víboras". Jesus chama os mesmos fariseus de "sepulcros caiados", branquinhos por fora, mas cheios de podridão por dentro. O livro de Apocalipse chama algumas comunidades cristãs de sua época de "sinagoga de Satanás". E hoje, quando alguém faz alguma crítica à igreja enquanto instituição, é acusado de blasfemar contra Deus. Como se Deus e a igreja fossem a mesma coisa. Não perceberam que a Idade Média acabou faz tempo?

          O Deus dos cristãos é estranho: diz que ainda que façamos maravilhas, milagres, prodígios, nada disso terá nenhum valor se não houver amor. Menos o casamento. O casamento, para o Deus dos cristãos, vale, mesmo sem amor. Tão diferente do Deus de Jesus...

          Dentro de uma igreja, o pastor prega que os filhos de Deus nasceram para prosperar, para usufruir de riquezas, dando como exemplo o carro importado que ele acabou de comprar com o dinheiro do dízimo. Na calçada em frente, o ex-funcionário de seu escritório, que ganhava um salário mínimo e foi demitido por não suportar o ritmo de trabalho imposto por seu patrão, chora, na companhia de uma garrafa de cachaça, pensando: "quando eu realmente for um homem de Deus, como é o meu ex-chefe, também vou prosperar. Mas antes, eu preciso largar esse maldito vício da bebida". O Deus dos cristãos definitivamente é esquisito. Muito diferente do Deus de Jesus.

          O Deus dos cristãos é esquisito. Ele perdoa quem mata, quem rouba, quem explora a prostituição, quem é pedófilo, corrupto, e por aí vai, mas não perdoa quem cometeu o simples erro de assinar um contrato social com uma pessoa a quem prometeu amar por toda a vida, mas não conseguiu. Para esses, o Deus dos cristãos tem apenas uma condenação horrenda: viver nessa prisão, que só não é eterna porque existe a morte.

          No meu Natal à brasileira, o Presépio mostraria o menino Jesus nascido em uma favela. Deitado em um colchão velho, ele teria ao seu lado Maria, mãe-solteira de 15 anos, e José, o velho dono do bar, seu tio, que a acolheu em seu barraco, já que seus pais a expulsaram de casa, ao saber que ela se prostituía. Nenhum animal estaria na cena além de Bandite, cão vira-lata e pulgento catado nas ruas, única compania de José, viuvo há 17 anos. À porta, os três "reis" da comunidade vêm pedir perdão e bênçãos: Baltazar, conhecido como "Taza", chefe do tráfico (e que poderia ser pai de Jesus, pois Maria é uma das muitas meninas que ele estuprou), Melchior, ou "Mel", travesti rainha de bateria do bloco de Carnaval, cega de um olho, graças e uma surra dada por jovens neo-nazistas de classe média-alta, e Gaspar, pastor corrupto que acabou de comprar um carro zero com o dinheiro do dízimo (menos o de José, que frequenta a igreja há 2 anos, tentando se livrar do vício da cachaça, mas que nesse mês não pagou o dízimo porque gastou todo seu dinheiro com fraldas e leite para o menino Jesus). Acharam a cena grotesca? Pois é exatamente esse o escândalo da Cruz: Deus se faz menino em meio às misérias humanas. Especialmente as piores misérias.

          No meu Natal à brasileira, Papai Noel seria "tio Bastião", um carreteiro nordestino de pele mameluca, de calça pescando e camisa de botão (mas já sem nenhum botão, todos eles perdidos pela estrada, durante suas andanças). Tio Bastião conduziria uma charrete puxada por um jegue já velho e desdentado de nome Fedegoso, tirando de seu jacá de vime esperança, emprego, alegria, saúde, fé, educação e comida para todo o povo brasileiro... delírio? Utopia? Concordo. Mas é melhor do que um homem branco de olhos azuis, morando numa terra distante cheia de neve, guiando um trenó puxado por renas, e distribuindo brinquedos...

          Diz a lenda que o filho de Martinho Lutero perguntou ao pai como deveria estar o céu na noite em que Jesus nasceu. Lutero tentou ilustrar enchendo um pinheiro que havia próximo à casa de velas acesas, e assim surgiu a Árvore de Natal. No meu Natal à brasileira, quando uma criança me fizer a mesma pergunta, vou apontar a mangueira atrás de minha casa, que sempre fica carregadinha nessa época do ano, para a alegria da família de saguis que vive nela.

          Uma das coisas que aprendi na vida é que decididamente não é o número de adeptos de minhas crenças o fator que vai torná-las realidade.

           Aprendi mais sobre o ser humano nos últimos anos de convivência do que em toda a minha vida de estudos. Percebi como o ser humano é ao mesmo tempo a mais patética e a mais sublime criação de Deus... ser humano, o paradoxo mais belo que já existiu...

          Nos últimos tempos de minha vida aconteceram-me tantas coisas, tantos conceitos foram revistos, que hoje em dia não sei se sou um cara melhor do que eu era, mas com certeza sou muito mais humano. Com tudo o que essa palavra implica.

          A Fé é o mecanismo através do qual nos tornamos capazes de superar os limites de nossa racionalidade.

          Estás ferido, e cansado da guerra, nobre guerreiro? Não tentes esconder tuas dores, sente-as, sangra, chora, clama pelos céus... assim irás reerguer-te, tal a Fenix que és, e que trazes ao peito. Não tentes ocultar tua humanidade, bravo cavaleiro, vive-a, pois viver é o que te cabe nesse chão que pisas. Sabe que foste chamado a ser herói, e aceitaste o apelo dos deuses, e eles estão contigo, ainda que tu não os veja nessa hora. Sê fiel, meu filho, o Pai está contigo. - Rodrigo Guimaraes, em "Conselhos ao Guerreiro Ferido".

          Na infância, criei um Mico-estrela em um viveiro. Certo dia encontrei-o morto, não sei a razão, talvez de tristeza, por não ter a companhia de outros de sua espécie. Minha avó, sábia, limitou-se a me dizer: "pensa agora na quantidade de macaquinhos que ele deixou de colocar no mundo". Foi meu último animal de estimação. Hoje meu prazer é ver os outros micos pulando de árvore em árvore na mata atrás da minha casa. E assim eu aprendi a amar os animais, deixando eles livres para serem eles mesmos. Amor de verdade liberta.

          Quando criança, apanhei certa feita uma lagarta enorme, e a pus dentro de um pote de vidro, sempre com folhas verdes para alimentá-la. Acompanhei ela comendo, crescendo, tecendo o casulo... até que um dia olhei o pote de vidro e vi uma borboleta imensa, que mal cabia dentro dele. Abri a tampa do pote, e segundos depois eu via a mais multicolorida das borboletas voando, e pensei: "ela fica bem mais bela fora desse vidro fosco". Nunca mais vi a borboleta, mas a lembrança daquelas asas que mais pareciam uma aquarela ficou até hoje em minha mente e em meu coração, mesmo passados quase trinta anos.

          No livro "Spartacus", após a morte do herói que dá nome à obra, Varínia, sua esposa, é vendida como escrava para um Senador do Império Romano, que era apaixonado por ela. Ao ver que ela se entregava às carícias dele sem resistir, o Senador indaga: "você não vai tentar resistir? Onde está aquele seu amor por Spartacus?" Varínia responde então com calma: "o Senhor me comprou, sou sua escrava, sua propriedade, portanto meu corpo lhe pertence, e o senhor pode fazer o que quiser com ele. Mas a minha alma o senhor nunca terá: essa sempre pertencerá a Spartacus." Ouvindo isso, o Senador a liberta. Corpos podem ser aprisionados, mas a Alma não. A Alma têm asas.

          Deus preza tanto a nossa liberdade que nos criou livres até mesmo para não acreditarmos n'Ele.

        Assim o Apóstolo Paulo descreve o verdadeiro Amor: "O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não se orgulha. Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente, não guarda rancor. O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta" I Cor (13:4-7). Uma linda canção de seu tempo. Qualquer coisa que difira disso não é amor, é posse, é mesquinharia, egoísmo.

          O Apóstolo Paulo, ao falar das três virtudes teologais (Fé, Esperança e Amor), coloca o Amor como a mais importante delas. Concordo com ele por duas razões: 1) Fé e Esperança apontam para um futuro na presença de Deus, não serão mais necessárias quando estivermos com Ele. Já o Amor vai continuar sendo exercido para todo sempre. 2) Enquanto Fé e Esperança dizem respeito a nós mesmos, na maioria dos casos, o Amor é sempre Amor por outro, sempre envolve uma relação entre seres.

          Eis a razão pela qual eu não crio pássaros: como vou explicar para a pobre ave que é um gesto de amor mantê-la presa em uma gaiola? Por eu dar água e comida? Mas isso ela tem na natureza. Por ser seguro dentro da gaiola? A ave sabe que existem os perigos, mas sabe também que ela foi feita para voar. Eu não crio aves porque as amo de verdade, e não quero privá-las de seu bem mais precioso: a LIBERDADE. Amor de verdade não aprisiona, não oprime. Amor de verdade liberta.

          Ser feito de amor num mundo feito de poder... ser autêntico num mundo que louva as aparências... buscar a verdade num mundo sedento por conveniência... só a Fé para nos fazer esticar as velas e tocar a nau para frente...

          A maioria das pessoas vive a vida cumprindo papéis sociais. Nascem, crescem, estudam, trabalham, casam-se, têm filhos e os criam... como se isso simplesmente fosse uma obrigação, formalidades para as quais todos nós fôssemos destinados... não, eu não sei viver assim... não sei viver sem que cada um desses atos seja executado entremeado por entusiasmo, garra, enfim, por amor. Quero que minha vida seja um ato de amor...

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

SOBRA-ME LASCIVIA E FALTA-ME A CANDURA...



Sobra-me lascívia e falta-me a candura...

Faltam-me as flores ladeando o caminhar despretensioso... falta-me o calor da areia afagando os pés, enquanto o sol prepara o crepúsculo marinho... falta-me a face beijada pela brisa fria que sibilia por entre as quaresmeiras, cujo brilho alvo torna grisalho o subir da serra...

Sobra-me lascívia e falta-me a candura...

Falta-me a visão do arco descrito pela gaivota sobre a seda esvoaçante de tez azul-esverdeada... falta-me a estrela refletida em um olhar que brilha ao contemplar o mais noturnal dos firmamentos... faltam-me os dedos entrelaçados, compartilhando a sensação aveludada dos gerânios... falta-me a lágrima, que escapa sorrateira por causa do rosto contraído no sorriso...

Sobra-me lascívia e falta-me a candura...

Falta-me a relva a cobrir os verdes prados, sob a chuva que lhe exacerba o frágil aroma... falta-me a Lua sobre o tapete negro, a companhia de estrelas cortesãs, algumas mesmo se atirando de alegria ante nosso simples caminhar, talvez querendo apenas arrancar um sorriso, ou um olhar, que diz tudo sem uma única palavra...

Sobra-me lascívia e falta-me a candura.

Falta-me o farfalhar multicor das borboletas, cuja dança faz a flor ver nelas anjos... falta-me o abrupto do silêncio, arrancado na frase não terminada, desejando que este se torne olhar, o olhar se torne beijo, o beijo se torne rubor, e assim um novo silêncio se celebra... falta-me a paz de quem sabe ter a eternidade, ainda que eternas sejam apenas as canções de amor...

Sobra-me lascívia e falta-me a candura...

Falta-me a concha encontrada sobre a alva cambraia da areia branca, que tal donzela sequiosa de desejo, timidamente permite o afago do mar... falta-me o som bruxuleante das procelas, que se faz canção para embalar o lenço que acena para a nau que parte rumo ao horizonte, mas que também consegue se esconder na concha levada ao ouvido...

Sobra-me lascívia e falta-me a candura...

Falta-me que os olhos esqueçam o ponto de chegada, para contemplar as belezas do caminho... falta-me o afago sem pressa, a vontade contida, guardada para que o amanhã lhe dê a concretude... falta-me a dor no peito, fruto do gargalhar inesperado diante do inusitado de um gesto, falta-me a mão, a lentamente percorrer o novo território, tal criança descobrindo o mundo para além de seu berço...

Sobra-me lascívia e falta-me a candura...

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Caminhando com o Filósofo...


 
Certa feita, um pastor protestante me disse que não existia a igreja perfeita, e caso encontrasse uma, eu não deveria nem entrar, porque a minha imperfeição destruiria a perfeição dela. Isso vale para todas as instituições. Na verdade, nós o tempo todo agimos confundindo algo "perfeito" com "algo que se encaixa perfeitamente em nossos anseios, mesmo os mais mesquinhos". O que também, diga-se de passagem, não existe.

Culpa desse meu gosto por versos tristes. Estar em paz e feliz deve ter feito o poeta que me habita sair por aí, em busca de uma alma cuja dor ele possa traduzir em poesia. Estou simplesmente sem inspiração para escrever coisas novas...

Algumas pessoas me consideram um mestre da retórica, outros elogiam a eloquência e a paixão com que eu sustento os meus argumentos, mas o fato é que eu sou totalmente incapaz de defender qualquer ideia, proposição ou assertiva na qual eu não acredite sinceramente.

Na peça de Brecht, quando ouve a crítica de que infeliz é a nação que não tem heróis, Galileu Galilei responde que infeliz é a nação que precisa de heróis. Eu diria que infeliz é a nação que desconhece os heróis que possui – uma singela homenagem ao povo brasileiro, em especial aos bombeiros e professores do Rio de Janeiro.

Vocês por acaso pensam que o cocô que vocês vêem boiando na Baía de Guanabara, quando olham das janelas de seus apartamentos, é inteiramente produzido por vocês, via todos os “disk-pizzas” que vocês consomem em seus casulos? Uma ova! Boa parte deles sai das favelas logo atrás de seus condomínios, essas mesmas que a mentalidade preconceituosa de vocês os faz fingirem que não existem.

Como diz Lulu Santos: "sempre houve espinhos nas rosas de qualquer jardim. E se há calor no ninho, há pedras no caminho, que ainda assim é belo". A vida é assim. O mar é lindo, mas é frio, salgado, tem ondas, e é cheio de bichos. Não quer encarar nada disso? Simples: não saia da banheira. Pelo menos lá os únicos perigos são os patinhos de borracha!

Como disse certa vez Raul Seixas: "se você quer entrar em buraco de rato, de rato você tem que transar". Não dá para fofinhos coelhinhos albinos de olhinhos vermelhos quererem entrar em buraco de rato, exigirem em seguida que os ratos se tornem coelhos de uma hora para outra, e ainda por cima ficarem reclamando do mau cheiro dos ratos.

Tio Raul Seixas já dizia: "pra passar a noite na cocheira tem que ter o mesmo cheiro do cavalo pra não incomodar". Dormir na cocheira e reclamar do cheiro dos cavalos terá como resultado, no mínimo, um relinchar de desagrado, e no máximo um coice.

Poetar: salpicar cardos e abrolhos em escarlate, para que roseiras pareçam aos olhos sedentos da visão da flor.

Rimar o insólito com o improvável. Concatenar o absurdo com o inominável. Amalgamar o abrupto com o impensado... eis a força de um sofisma, o pedante de um aforismo, a sublime arte de nada dizer...

Se um disco voador surgir do nada na minha frente, e dele sair um casal de ETs dizendo que a minha experiência com minha família adotiva na Terra acabou, e está na hora de voltar para casa, juro para vocês que eu não iria me surpreender.

O humor é um vício, uma doença. Mais forte do que eu, simplesmente não consigo resistir. Perco o amigo, mas não perco a piada. Que minha "vítimas" me perdoem...

E o seu silêncio
Aponta o olhar 
Que traduz a alma

Que me perdoem os psicólogos, filósofos, sociólogos e outros teóricos, mas se alguém me diz que tem um cachorro do outro lado do muro, não imagino de cara que isso seja um símbolo opressor, conteúdos reprimidos do inconsciente, ou qualquer coisa parecida. Minha primeira hipótese de trabalho é que realmente há um cachorro do outro lado do muro.

Não me importam as dores, não me importam as infelicidades... se eu perder a fé no ser humano, terei perdido a fé na única coisa que é imagem e semelhança de Deus na Terra... eu terei me tornado ateu.

Fé não é agir apenas quando temos a certeza do sucesso. Fé não é agir sem levar em consideração que pode haver o fracasso. Fé é agir sabendo que, não importa o que aconteça, terá sido o que de melhor poderia ter nos acontecido.

Os limites entre a coragem, a loucura e a burrice são tão tênues que às vezes é impossível diferenciá-los. Mas quando há Fé, essa diferenciação se torna desnecessária. Mesmo porque sanidade e inteligência em excesso sempre produzem medo.

Li em um livro de Carl Sagan que nós compartilhamos 99,6% de nossos genes com os chimpanzés. O que me assusta não é o fato de termos 99,6% de nosso genoma idêntico ao dos chimpanzés, mas sim o fato dos 0,4% restantes fazerem tanta diferença.

Amigo é um irmão que a vida nos deixou escolher.

Poeta: és o mais vil dos criminosos. Mentes com uma destreza tal, que em tuas palavras toda a aspereza desse mundo frio e cinzento ganha a maciez da mais cândida das flores, aquelas mesmas que cultivas no jardim imaginário onde enterras os corações de todos aqueles que sucumbem ante o veneno de tua poesia.

Poetar: transformar com palavras o pranto em canção, o olhar em esperança, as marcas das dores em pintura, e as lágrimas no mais fino mel, cuja candura adoçará o amargor de uma alma sequiosa por beleza e poesia. Maldito sejas, ó poeta, que fazes da tristeza matéria-prima de tua arte!

Se é verdade que só amamos de verdade uma vez na vida, a minha ainda não chegou. Mas se amamos de verdade mais de uma vez, posso dizer que minha vida sempre foi um puro amar...

Há 34 anos, fui deixado aqui na Terra, disfarçado de terráqueo, com a missão de estudar os seres humanos, compreendê-los, e então retornar ao meu planeta natal com um relatório detalhado. Como pedirei desculpas aos meus superiores por ter falhado? Até hoje não compreendo os seres humanos, e meu relatório continua em branco.

"Quero a paz se possível, mas a verdade a qualquer preço." Fiz dessa frase de Lutero um dos lemas de minha vida. Pena que o lema da maioria das pessoas é: "quero a verdade se possível, mas a paz a qualquer preço". Quando será que as pessoas vão perceber que a paz sem a verdade é apenas calmaria?

O tempo é o mais sábio de todos os juízes. Quantas vezes na vida eu não preferi manter o silêncio, mesmo às custas de fazer as pessoas não entenderem minhas atitudes, para o tempo fazê-las enfim dizer: "é, agora eu o entendo, e vejo que ele teve suas razões".

Não adianta prendermos os corpos, ainda que a prisão seja apenas a de uma vida dura. A alma têm asas, voa não só no espaço, mas também no tempo. O sonho é o vôo da alma.

Eu quero um beijo no rosto
Gostar de sentir o seu gosto
Um sorriso e uma bandeira
Voando de qualquer maneira
E no rumo dos sonhos perdidos
Meu palco de amor e libido
Eu quero a paz do seu rosto 
O prazer de sentir o seu gosto
(da canção “Nossas Bandeiras”, composta há cerca de quinze anos).

Engraçado: antigamente, os seres humanos me faziam ficar decepcionado, revoltado, indignado... hoje em dia, um dar de ombros quase estóico é tudo o que eu consigo fazer... será que finalmente eles estão conseguindo me convencer?

Qualquer pessoa deste mundo, desde as mais chegadas, passando por aquele desconhecido que viaja no mesmo ônibus todos os dias, o mendigo que nos pede dinheiro, a prostituta que tenta nos convencer de que somos lindos, até o mais vil dos criminosos, cujo rosto pagamos para não ter que olhar... todos eles trazem em si uma dignidade de "Imagem e Semelhança de Deus", e por isso mesmo merecem ser cuidados.

Síndrome de Simão Bacamarte, eis o que me acomete...

Como dizia dom Raulzito: "eu nunca cometo pequenos erros, enquanto eu posso causar terremotos". Esse aspecto "shivesco" de minha personalidade é essencial, mesmo porque às vezes as pessoas só começam a construir casas bem alicerçadas depois de verem suas antigas moradas postas abaixo por um furacão.

Se cada ser humano desse mundo pudesse por um momento largar tudo para apenas contemplar uma rosa... olhar para a beleza daquela forma escarlate, sentir nos dedos a maciez de uma única pétala, a caricia do perfume... e se todo mundo entendesse isso como um presente de Deus, para nosso deleite...

Algumas pessoas agem como avestruzes: ao menor sinal de perigo, enfiam a cabeça em um buraco, e se sentem protegidas com isso. E sem perceber, ficam lá, com todo o resto do corpo para fora, e o rabo para cima, para a qualquer momento a "naba" entrar, e entrar com força - Rodrigo em "Filosofia de Estivador".

Toda mudança é como mergulhar num mar gelado em um dia quente: primeiro vem um choque, depois uma dor momentânea, mas logo depois vem simplesmente o prazer de estar nadando.

Não vim ao mundo fazer política de boa vizinhança ou para entreter as pessoas. Vim ao mundo para transformá-lo, ainda que apenas dentro dos estreitos limites de minhas possibilidades. Minha meta é que todo mundo que tenha contato comigo saia dele uma outra pessoa. E se a mudança será para melhor ou para pior, vai depender deles, e não de mim.

Conversa entre os cães de Pavlov: "viu como conseguimos fácil condicionar aquele cientista idiota? Agora basta a gente latir, que o pobre coitado vem e nos dá comida!"

Sinto informar, meninas (e alguns meninos), mas não existem homens metrossexuais, somos no máximo CENTIMETROSSEXUAIS. Claro que em alguns casos temos muitos centímetros. Mas ainda assim são apenas centímetros - sessão "Humor Zorratotaliano", by Rodrigo.

Tenho pena das crianças de hoje. No meu tempo, criança quieta era boazinha, e criança agitada era levada. Hoje criança quieta é depressiva, e criança agitada é hiperativa.

Eis o meu grande dilema dialético: se Deus não tivesse criado a mulher, nós, homens, estaríamos até hoje no paraíso. Mas como eu posso chamar de paraíso um lugar que não tem mulheres?

Humor no diva: a psicanálise e uma ciência especializada em piorar problemas que ela mesma inventa.

Meu mundo perfeito não teria funk, Gugu, Faustão, pagode, sertanejo universitário, bife de fígado, nem Alexandre Pires ou Garotinho... mas peraí: um mundo que não tivesse nada do que eu pudesse falar mal seria realmente perfeito?



sábado, 11 de junho de 2011

MAIS UM POUCO DE FILOSOFIA DE FACEBOOK



Se menina, estrela na testa
Se mulher, fogo incontido
Sou rico do que não presta
Sou pobre caso perdido
Seu olhar me faz poeta
Seu corpo me faz bandido
(da canção “Poeta e  Bandido”, de Zé Geraldo e Carlos Guerson)

Não amo ninguém pela beleza, intelecto ou caráter... nem sei dizer por que amo... o amor é o mais incondicional dos sentimentos... o amor não suporta motivos, explicações... o amor se justifica por si mesmo, e não há racionalidade que o dome... falar de amor já é não-amar... amor não se sabe, não se pensa, sequer se sente... AMOR SE VIVE

Eu costumo dizer que tentar ser mais maluco do que todo mundo é inútil, porque quando a gente pensa que chegou no fundo do poço, sempre vem um desgraçado e faz pior.

Nascer e morrer são situações nas quais estamos completamente sozinhos, ninguém nos acompanha nessas duas viagens. São as únicas certezas que temos na vida. Entre um e outro pairam apenas pontos de interrogação existenciais, potencialidade pura. Nascemos e morremos por acidente, e vivemos pela fé - Rodrigo "kierkegaardeando".

O passado nao pode ser modificado, mas ele pode ser recontado, reescrito com outras palavras, e com isso ser ressignificado. Um novo passado pode ser a chave para um novo futuro.

No fundo, no fundo, a vida é feita de perdas e de renúncias. Cada vez que escolhemos um caminho a seguir, estamos automaticamente renunciando à todos os outros caminhos possíveis naquele momento. E nos tornamos sábios quando conseguimos fazer essa escolha sem a dúvida de como seria se nossa decisão fosse diferente, ainda que o resultado de nossa escolha não nos agrade.

A astronomia amadora me ensina mais filosofia do que eu mesmo poderia pensar. Hoje sei que muitas vezes nossos piores problemas podem nos ensinar as lições que mais nos farão crescer como pessoa. Aprendi isso descobrindo que é quando a noite está mais escura que podemos melhor observar os corpos celestes.

Saturno a olho nu parece uma estrela comum, pequena inclusive, se comparada com Sirius. Pelo binóculo, torna-se como uma amêndoa vermelha. O telescópio mostra o círculo com o disco que vemos nos livros, agora de cor prata. Não sei que aparência ele teria se eu fosse lá. Assim a astronomia amadora demonstra como diferentes pontos de vista mostram a mesma realidade de formas diferentes.

A Bíblia é quase sempre mal interpretada. Precisamos de nossas individualidades. Se duas pessoas, ao se unirem, se tornarem uma só coisa, tudo o que vai acontecer é que, caso elas se separem, sobrarão apenas duas metades.

Num mundo em que ser normal é empreender uma busca desenfreada para seguir todas as modas, tendências e padrões que nos são impostos por uma sociedade doente, viciada em consumo, a loucura pode ser um grito de libertação.

A maioria das pessoas já falecidas que admiro só tiveram suas ideias e seus valores reconhecidos depois de suas mortes. Espero que tão cedo ninguém me descubra como um gênio...

Meus olhos de nuvem
Choram de alegria
Para regar o seu sorriso

Na tez morena
Abre-se em branco
A cor do seu sorriso
 
No jardim que plantaste
Em meu fértil coração
Cavaste sua sepultura
 
O que perdoar não é:
Perdoar não é concordar com a ofensa: isso se chama "conivência";
Perdoar não é esquecer que a ofensa existiu: isso se chama "amnésia" (pode nos levar a cometer ofensa igual, no futuro);
Perdoar é não concordar com a ofensa, é não esquecer que ela ocorreu, até para podermos aprender e ensinar com ela, mas é no fim dizer: "isso não importa mais".

A Justiça, quando exercida com Compaixão, leva-nos sempre a perdoar. Justiça sem Compaixão é apenas vingança.

Defender o indefensável, argumentar o "inargumentável", pedir o impossível, aceitar o que é anaceitável, crer no que é incrível... só a fé nos permite superarmos os limites de nossa racionalidade, e mais, de nosso senso de justiça. Mas o coração estranhamente não nos deixa desistir - Rodrigo Kierkegaardeando.

Nossas relações humanas seriam muito melhores se tivéssemos sempre disposição de ânimo de tentar entender as motivações que levam as pessoas a fazerem o que fazem. E entender não significa necessariamente concordar. A Compaixão é um sentimento tão bom, que ela consegue ser, no final das contas, mais justa do que a própria Justiça.

                  Vendo meu "acervo artístico", percebi que eu jamais compus uma canção de amor enquanto estava amando. Amar parece fazer adormecer o compositor, ainda que desperte o poeta. E é bom que minhas canções de amor não sejam autobiográficas, porque à exceção de uma, todas elas são canções tristes.

                  E por trás do vidro da janela do carro, o menino vê a chuva lentamente demolir o seu castelo de areia... (dedicado aos meus amigos)
                  Mesmo depois da rosa se despetalar, ainda sobram os espinhos. E esses, talvez por saudade, talvez por despeito, desenham com sangue novas rosas vermelhas nos imprudentes dedos do jardineiro amador (dedicado aos meus amigos)





 


sexta-feira, 3 de junho de 2011

O Monstro da Dúvida (baseado no "Mágico de Oz")

Mas a dúvida é o preço da pureza, e é inútil ter certeza
(da canção "Infinita Highway", dos Engenheiros do Hawaii)

Queira, basta ser sincero e desejar profundo
Você será capaz de sacudir o mundo, vai
Tente outra vez
(da canção "Tente Outra Vez", de Raul Seixas

           De todos os monstros a habitarem as profundezas de nosso ser, nenhum deles mostra suas garras afiadas de forma tão cruel, sádica e torpe quanto aquele conhecido como “Dúvida”. Trata-se talvez da criatura mais perversa, dentre todos os nossos monstros internos, por ter o sinistro poder de a todo momento mudar de forma.
           Em certos momentos, a dúvida surge tal fada-madrinha, a nos afagar o rosto, apontando-nos uma felicidade que nos acena, logo ali, no final da estrada de pedras amarelas. A face terna da dúvida se traduz no frio na espinha, na expectativa de um acontecimento bom, nos olhos que se fecham para que a visão da alma possa desenhar o quadro mais belo que o pincel do futuro está pronto para pintar na tela de nossas vidas. O coração acelerado pela simples contemplação da pura potencialidade do amanhã travesso, que como num jogo de criança insiste em esconder o próprio rosto, negando-nos a beleza de suas feições, torna-se instrumento musical, a dar o tom e o compasso para a dança da dúvida, aqui divindade bela e bondosa, sempre a nos fazer olhar para a frente. Porque ela está a todo o tempo afirmando que no final da estrada de pedras amarelas, nos esperam as maravilhas da cidade de Oz.
           Mas daí surge o aspecto mais monstruoso da dúvida: a todo momento ela muda de forma, quase sempre com a caprichosa mania de contrariar as expectativas de nossos corações e mentes já fartos de caminhar pela corda bamba da vida. E da criatura suave e maternal nos apontando o sol prestes a nascer após o negror da noite, ela simplesmente se transmuta, vestindo o mais horrendo dos trajes. Assim, a fada de vestes sedosas dá lugar a uma bruxa trajada em negro, maquiavélica tanto quanto malévola, lasciva tanto quanto astuta. Para ela, a estrada de pedras amarelas tem ao seu fim um abismo sem fundo e inescapável, na verdade a garganta de outro monstro faminto, conhecido como “Desilusão”. A face sombria da dúvida sempre surge acompanhada de outros monstros, ávidos por dilacerar nossas almas, sedentos do suor de nossos pesadelos, deleitando-se, como se sinfonia fosse, com nossos gritos desesperados. Medo, Tristeza, Angústia, entre outros, são inseparáveis companheiros da Dúvida.
           O que fazer, então, diante de tão esquizofrenicamente cruel criatura? Sair em fuga desesperada é a mais tola das atitudes; não há como fugir de monstros que, em última análise, habitam nosso próprio ser. Estão dentro de nós, espelhos que são, de nossos aspectos mais sombrios. No fundo, são parte de nós, Legião que não podemos expulsar para nenhuma manada de porcos fora de nós mesmos. Não há manadas de porcos do lado de fora. O lado de fora é puro poder-vir-a-ser, pura conjectura. O lado de fora é o habitat natural da Dúvida. Cerrar então nossos ouvidos espirituais, para não ouvirmos o funesto discurso do monstro? Ela é obstinada, e não se dará por cansada de repetir suas piores admoestações, seus mais fúnebres sortilégios, até exaurir por completo todas as nossas forças.
           Não há como fugir de algo que está dentro na gente. A única solução contra esse monstro, então, seria o combate aberto, frente à frente com nosso inimigo, por mais poderoso que ele possa perecer. Mas é um combate que não pode ser travado com unhas e dentes, muito menos com espadas e escudos. Precisamos de outras armas, essas armas do espírito, afinal, nossos inimigos também são “espíritos”, não possuem materialidade. Armemo-nos, então, primeiramente de Coragem. Nobre arma de defesa, a Coragem não nos faz deixarmos de ver ou ouvir as ações atrozes de nossa inimiga, mas nos torna capazes de seguir em frente, de trilhar a estrada de pedras amarelas. A diferença? Não importa se a estrada termina em Oz ou na boca da Desilusão: o caminho precisa ser caminhado, a vida precisa seguir seu curso. E só a Coragem nos permite avançar na trilha do caminho.
           A segunda arma se chama Esperança. Arma com poderes mágicos, capaz de falar, não aos nossos ouvidos, mas aos nossos corações. Em cada momento de nossa caminhada pela estrada de pedras amarelas (na verdade a estrada da vida) em que sentirmos nossas forças exauridas pelas constantes maldições da Dúvida, a Esperança nos sussurra palavras de consolo, de admoestação, de exortação. E essas palavras tornam-se verdadeiros elixires ou pedras filosofais, não apenas renovando nossas forças, mas também devolvendo o fio à lâmina da Coragem.
           Com essas duas armas, somos capazes de enfrentar o monstro da Dúvida. Mas o que fazer se chegarmos ao fim da estrada de pedras amarelas, e ao invés das belezas de Oz, ou da bondade de seu Mágico, encontrarmos apenas o abismo da Desilusão? A Desilusão possui um aspecto amedrontador, terrível. Parece até mesmo mais poderosa do que sua prima-irmã Dúvida. Mas sucumbe frente ao golpe de uma única arma: o Amor.
           Não podemos deixar de caminhar na vida; a estrada de pedras amarelas precisa ser percorrida. E nesse percurso não há como não termos a companhia de nossos monstros existenciais, especialmente a tão poderosa quanto irracional Dúvida. E por não raras vezes, o fim da estrada será a boca da faminta Desilusão. Mas o Amor é arma que tudo vence, não importando o poder do inimigo, ou se ele vive dentro ou fora de nós. Amemos, então, pois o amor é uma arma que só tem existência quando posta em movimento, só existe no realizar-se, no amar. Sob o fio do Amor, todos os lugares são belos como Oz. O Amor é como as lentes que o Mágico de Oz fazia as pessoas usarem, a fim de que elas pensassem que a cidade na verdade era de toda feita de ouro. Mas também há uma diferença crucial: as lentes do Amor não produzem Ilusão (esta outro monstro, também irmã da Dúvida). As lentes do Amor não fazem todas as coisas parecerem feitas de ouro, elas fazem todas as coisas verdadeiramente passarem a ser feitas de ouro. Sob as lentes do Amor, tudo é áureo, tudo é dourado. Tudo brilha.

domingo, 29 de maio de 2011

NOVOS HAIKAIS E FILOSOFIA DE FACEBOOK


Mas eu sou o amargo da língua
A mãe, o pai e o avô
O filho que ainda não veio
O início, o fim e o meio


(da canção "Gîta", de Raul Seixas e Paulo Coelho)

           Quem navega por sites de redes sociais pode perceber como as pessoas têm apreço por frases de efeito, frases que tenham conteúdo em suas mensagens. Todavia, quase sempre são citações de pessoas famosas, filósofos, cientistas e artistas em sua maioria (e minha alma tem um pouco de cada um dos três). Num momento em que a intensidade de minha vida pessoal me faz ter pouco tempo para reflexões teóricas, gostaria de deixar meu amado leitor com uma filosofia um pouco menos estruturada, a partir de frases de minha própria autoria, postadas no site Facebook, bem como uma segunda remessa de Haikais. Creio que ambos podem falar muito não exatamente de minha filosofia, mas de mim mesmo como “filósofo”. Espero que gostem.


“Algumas pessoas são reconhecidas por terem algum talento, independentemente de seu caráter. Eu quero ser reconhecido, antes de tudo, pelo meu caráter, independentemente de quaisquer talentos que eu possa vir a ter”

“Perdido entre a ciência, a fé, a filosofia e a poesia, flutuando entre mesas de bar, estádios de futebol, cachoeiras e passeatas, girando entre a guitarra e a viola caipira, tendo Deus como fonte de inspiração de todo esse caos”
(Rodrigo por ele mesmo)

“A poesia talvez seja a minha maior maldição. O poeta é o ser que mais arranca lágrimas dos olhos das pessoas, ainda que por vezes sejam lágrimas de alegria. Não há nada mais vil do que tornar belo tudo o que é triste”

“Hispânica rima com promessa, que o espírito semeia ao grávido futuro, no afã de que se pinte a cor no cenário cinzento de um coração vazio, tal mandacaru a florescer em desertos prados”

“Eu amo a beleza física feminina, não posso negar. Mas não conheço nada mais afrodisíaco do que uma mulher inteligente”

“Será que eu comecei a olhar o céu em busca de uma resposta? A Lua, Saturno, Júpiter, os aglomerados de estrelas e as nebulosas são todos belos, bailam belamente pelo céu... mas teimam em se deixar contemplar por mim calados...”

“Se no fim da vida eu pudesse voltar no tempo, eu faria absolutamente tudo diferente do que fiz... não que eu não goste da minha vida, mas assim eu teria vivido duas vidas, e não uma única vida duas vezes”

“Toda crença solidamente embasada pode se dar ao luxo de um certo ceticismo. Normalmente, quando não somos capazes de tolerar quem pensa diferente de nós, é porque nós mesmos não estamos tão seguros assim em relação às nossas próprias ideias”

“Não consigo entender... Jesus nos prometeu o Reino de Deus, e em seu lugar veio a igreja”

“Ler a Bíblia de forma superficial me fez entrar para a igreja. Ler de forma aprofundada me fez sair dela”

HAIKAIS

No choro da viola
Faz-se a dor do violeiro
Em sorrisos da plateia

Eis que surge ao vento
O balé das folhas
Que desenham o outono

Mares são lágrimas
Derramadas pelo porto
Chorando a partida da embarcação

Vingou-se a rosa
A mão que a depedaçou
Ainda exala o seu perfume

O vento toca o rosto
Traz o beijo distante
Que insiste em ser beijado

Perdida entre aforismos
A Poesia clama
Vem, ó Liberdade!

Meu olhar procura
Velhas respostas
Para teus jovens “por quês”

No teatro de minha vida
Que a cortina desça
Sob aplausos da plateia

sábado, 14 de maio de 2011

HAIKAI - PEQUENA GRANDE POESIA

 Haikai... trata–se de pequenos poemas de origem japonesa. Com apenas três linhas, e tendo como foco a objetividade e a concisão, os Haikais nem por isso perdem a beleza ímpar, e soam como os antigos ditados da sabedoria popular. Confesso que durante toda a minha vida de poeta, jamais consegui compor Haikais de valor, mesmo no estilo mais livre da língua portuguesa. Mas como a inspiração nos surge às vezes sem que sequer o percebamos, ou mesmo peçamos, eis que me vi, como que do nada, escrevendo Haikais livres, sem rimas ou métricas. E já que esse blog também é destinado à poesia, queria deixar você, meu amado leitor, com o que é a primeira safra de Haikais de minha autoria. Peço perdão pelo mau jeito, por ser uma forma de arte na qual não sou versado, mas espero que os versos sejam de algum valor, que possam ser apreciados. Lembrem apenas que cada grupo de três linhas constitui um poema independente, com começo, meio e fim próprios.

Amor: subversão da matemática
Simbiótica comutatividade
Multiplica-se ao ser dividido

A nau se afasta
Afasta-se o horizonte
Encontros que acontecem no infinito

Assim a flor
Como quem viu um anjo
Se despediu da borboleta

Do alto do monte
Chora o alpinista
Não alcançou as estrelas

Que dizer das flores
Se o que nos marca
Sempre são os espinhos?

E no mar da vida
O pescador lança a rede
Nela seu sonhos se debatem

Silêncio
Canção que se faz pausa
Para que cantem os olhares

Eram mãos insensatas
Choraram em vermelho:
A rosa tinha espinhos

O poeta se cala
Poesia que vaga
Buscando a musa

Suave mansidão
A gaivota plana
Sobre um lençol azul

E o jovem cosmonauta
Percebe com pesar
A Terra era azul

Folhas ao chão
E o outono cinza
Desbota o verde olhar

Saudando a Lua
Luzem vaga-lumes
Que sonham ser estrelas

Tímida poesia
De olhos que evitam
O encontro do olhar

sexta-feira, 29 de abril de 2011

A INEXORABILIDADE DA SINFONIA CÓSMICA


Ói, olhe o céu, já não é o mesmo céu que você conheceu, não é mais
Vê, ói que céu, é um céu carregado e rajado, suspenso no ar

Vê, é o sinal, é o sinal das trombetas, dos anjos e dos guardiões
Ói, lá vem Deus, deslizando no céu entre brumas de mil megatons

Ói, olhe o mal, vem de braços e abraços com o bem num romance astral
(da canção “Trem das Sete”, de Raul Seixas)


            Vivo hoje uma serenidade quase estóica. É inescapável que quaisquer olhares humanos, do contemplar mais poeticamente ingênuo ao mais abalizadamente científico escrutínio dos meandros da natureza, enfim, todo o ato humano de ver, só nos tragam uma única certeza aos nossos corações e mentes ávidos por conhecimento: todos nós, entes do Cosmo, desde a mais ínfima partícula subatômica, até o mais complexo dos seres autoconscientes,  bailamos ritmados, em movimentos circulares de quase moto-perpétuo, tal qual um carrossel rodopiando frente aos olhos vidrados de alguma infantil divindade.
            Pouco podemos fazer para alterar esse quadro. A criação segue sua dança infinita, e talvez nosso debater constante, nossas tentativas patéticas de alterar o ritmo do balé cósmico não provoquem nada além de quase imperceptíveis cócegas nesse imenso corpo em movimento chamado Universo. Do alto de nossas arrogâcias pueris, nos degladiamos em debates infindos sobre os reveses que estamos causando no Cosmo, e em nossa tresloucada megalomania, acabamos por não nos darmos conta de uma verdade simples, tão simples quanto gritante: no máximo, temos o poder de arruinar nosso berço, nossa mãe Gaia (claro, e nós mesmos com ela, juntamente com todos os outros seres viventes de nosso planeta). Por mais vil e torpe que seja esse matricídio, certamente o restante dessa enorme família de corpos celestes flutuantes continuará vivo. Um pouco ressentidos, talvez, pela perda de um ente querido. Mas a recuperação, se pensarmos em termos das dimensões temporais do universo, será até rápida. Isso porque a mãe Terra é tão somente uma minúscula célula em um organismo de dimensões imensuráveis, uma pequena peça, girando no sistema de engrenagens de uma máquina inimaginavelmente grande, ao menos aos olhos estupefatos do sujeito chamado de observador ingênuo pela nossa tão cartesianamente metódica ciência. Pouca falta fará ao todo um repentino desaparecimento da Terra. Todavia nós, meras crianças cósmicas, ainda padecendo do típico egocentrismo infantil, incapazes de vermos a nós mesmos em outra situação que não entronizados no centro, no mais elevado patamar da criação, imaginamos que uma eventual ausência nossa silenciará a música das esferas, e com isso cessará toda a atividade do grande dançarino cósmico. Como se um bailarino interrompesse sua melhor apresentação por causa da perda de um simples fio de cabelo, ou de uma única lantejoula de suas vestes. Na verdade, apenas não estaremos lá para aplaudir o espetáculo. Mas mesmo assim, como se diz nas terras do imperialismo, do hamburger e do cristianismo fundamentalista, “the show must go on”. A vida segue seu curso.
            Alguns chegam ao desvairio de se proclamarem demiurgos, criaturas semi-divinas, com poderes para moldarem seus próprios universos, ao seu bel-prazer e em acordo com a quase sempre não assumida finitude e a sempre ontológica contradição de suas capacidades de produzir conhecimento. Como se até mesmo o psicodélico e multicolorido farfalhar das asas de um bando de borboletas monarcas, cruzando o planeta em sua migração anual, fosse responsabilidade deles. Desfortunamente ou não, caras crianças cósmicas, a maravilhosa Sinfonia Espaço-temporal, cujo primeiro ato teve seu início bilhões e bilhões de anos atrás, quando o Grande Maestro do Universo brandiu sua batuta criadora pela primeira vez, num gesto batizado pela ciência de “Big Bang”, não pode parar, e não o fará, enquanto a última nota não for entoada. E a sinfonia será executada até o fim, mesmo com uma possível ausência de um ou outro músico. Ou por acaso alguém supõe que o Sol aguarda pacientemente que hajam olhos para contemplar a beleza de uma simples aurora, para só então poder nascer?
            No fundo, no fundo, somos a todo tempo assolados pelo incômodo dessa constatação, talvez por ela fazer passar diante de nossos olhos incrédulos, escrita em letras de neon como num letreiro barato de beira de estrada, feio mais impossível de não ser notado, a certeza que acaba por deflagrar e exacerbar a nossa própria condição de finitude. Detestamos admitir, mas faremos muito menos falta ao Universo do que nosso pusilânime egocentrismo desejaria. Não nos iludamos, ó homens de pequena fé, mas tudo o mais na Sinfonia Cósmica, toda a dança do Universo, seguirá seu rumo mesmo sem nós. Desde o nascimento de uma estrela, passando pelo choque entre galáxias, pelos quadros de arte moderna pintados pelas mãos habilidosas da mãe Natureza, como no caso das auroras boreal e austral, ou das ancestrais nebulosas, até a eclosão de um ovo de mosquito, ou da cantoria tão animada quanto carente de afinação do pipoqueiro da esquina, tudo estará lá, no mesmo lugar. Não no mesmo lugar físico, mas no mesmo ponto da pauta musical cósmica, ou no mesmo movimento da coreografia do Universo. Apenas nós não mais estaremos presentes. Mas não faltam olhos extras para contemplar a magnitude da Criação. E mesmo que não houvesse olhar algum, nenhuma diferença faria. O Universo não precisa de olhos o contemplando para ser belo.
            Assim me sinto, entre o estóico e o Zen. Poucos prazeres suplantam o deleite de apreciar a Sinfonia Cósmica, a dança do Universo. Mais inebriante ainda é nos sabermos parte delas, ainda que pequeninas partes, tal grãos de areia perdidos em uma extensa praia. E nosso passamento não pode ser pensado acompanhado de uma vontade imensamente egoísta de querermos que o espetáculo seja interrompido por conta de nossa ausência. Se a manifestação das maravilhas da criação prescinde de olhos para apreciá-la, que dirá de um par de olhos específicos, e no caso sempre os nossos próprios? Aprender essa lição gera desapego, mas não um desapego apático, não um dar de ombros desinteressado para tudo o que a Criação nos proporciona. Isso seria como sair do caldeirão, para cair diretamente no fogo, se estamos tentando nos desvencilhar de um apego neurótico ao mundo material, este que só produz o desespero e o medo da morte, e nos torna monstros devoradores de bens de consumo (como se o prazer de consumir nos devolvesse a sensação absurda de sermos imortais). A participação no cantar e dançar do Cosmos precisa acontecer de forma intensa, porém serena. Uma canção, um quadro ou um copo de cerveja devem ser apreciados pelo que eles possuem de belo, de agradável, e não pela ilusão de que o mero ato de apreciar traz algo de concreto para nossas existências. Se assim o fizermos, ficaremos escravos de nosso anseio por prazer, e pior, iludindo-nos com a ideia de que o que nos prende é o objeto de nossa cobiça, e não nosso próprio movimento de cobiçar. Somos escravos de nosso próprio desejo, e os objetos de consumo são tão somente ferramentas que nos permitem operacionalizá-lo, apontá-lo para alguma direção específica, dar-lhe um sentido, um nome. Assim, o desejo se torna desejo de algo. Exorcisamos e expulsamos para as diversas manadas de porcos existentes em nossa volta a nossa própria Legião interna, nossos demônios mais íntimos, para assim podermos combatê-los em algo fora de nós mesmos.
            Viver, então, se torna a sublime e às vezes difícil arte de cantar e dançar ao som da Sinfonia Cósmica, ainda que saibamos que nossa participação nela não alcance sequer um compasso da Partitura Divina, e poderemos nos proclamar sábios quando alcançarmos uma compreensão plena de que a Sinofia é bela, mesmos naqueles trechos dos quais não participamos. O Canto Universal é belo, mesmo nos momentos em que nossas próprias vozes estão em silêncio, ou quando nossos ouvidos não estão lá para ouvir. E a Dança do Universo será sempre bela, mesmo quando nossos corpos já há muito estiverem imóveis.
           

sexta-feira, 15 de abril de 2011

HUMOR TAMBÉM É FILOSOFIA ou DIA DO BEIJO?


Vou jogar no lixo a dentadura, neném. Vou ficar banguelo numa boa
É que eu vou fundar mais um partido também!
Vou rasgar dinheiro, tocar fogo nele, só prá variar

(da canção “Só Pra Variar”, de Raul Seixas e Cláudio Roberto)


Sempre considerei o humor uma excelente arma de crítica. Não esse humor repetivivo, alienado e extremamente pornográfico tão em voga na atualidade, do tipo “Zorra Total”. Falo da linguagem humorística de nomes como Ziraldo, Millôr Fernandes, ou como os programas televisivos de humor da década de 80 do século passado.
Passando pelos textos publicados em meu blog, pude constatar uma coisa: muito embora o humor surja pontualmente, em um ou outro comentário meu, o blog ainda carece de um texto cuja linguagem principal seja o humor. Problema fácil e agradável de ser resolvido.
Essa semana vi ser martelado de forma exaustiva, no site de redes sociais Facebook, o fato do dia 13 de abril ter sido o dia do beijo. Dia do beijo, esse povo não tem mais o que inventar, não? Para mim, o ano tem 365 “dias do beijo” (e de quatro em quatro anos tem até 366!), e não apenas um. Pesquisando pela grande rede, descobri uma míriade de datas comemorativas no mínimo inusitadas: dia do leitor, dia do enfermo (imagina alguém parabenizando outra pessoa por estar doente no dia do enfermo), dia dos gatos, dia do contador de histórias, dia da compreensão mundial (!?!?), e por aí vai. E mais divertido (ou deprimente, conforme o seu estado de espírito ou seu nível de conscientização) é ver quase todo mundo aderindo, fazendo propaganda. Sendo assim, resolvi propor a criação de algumas datas comemorativas bizarras (direitos iguais: se outros podem fazê-lo, por que não eu?). Vamos à elas:

1) O dia mundial do peteleco no pé da orelha – imaginem pessoas ao longo do dia trocando petelecos no pé da orelha, como se fossem presentes, e agradecendo-se mutuamente. Ao chegar em casa, o marido poderia dizer à esposa: “querida, tive um ótimo dia: dei 127 petelecos nas orelhas dos outros, e levei mais uns 116” (o dia é do peteleco, não esqueçam. Vale tanto dá-los como recebê-los). A esposa então pensaria: “eu só levei um peteleco, do carteiro. Mas não foi no pé da orelha”. Olha eu escrevendo o mesmo tipo de piadinhas “zorratotalianas” que eu tanto critico!

2) O dia mundial do pum – esse seria sensacional. Todos os restaurantes, bares, churrascarias e afins serviriam feijoada, batata doce, repolho e ovos cozidos. O espetáculo seria imperdível. Poderíamos também realizar competições entre os peidões, tanto os profissionais quanto os amadores. Essas competições seriam divididas em categorias: o pum mais alto, o pum mais fedido (essa um primo meu ganharia fácil), o pum mais longo, exibição de puns polifônicos, puns sincronizados (para aumentar o espírito de equipe das pessoas).

3) O dia do Churrasquinho de Gato, do Angu do Gomes e do Picolé do China – quem vive ou conhece o Rio de Janeiro, certamente já teve contato com esses ícones de nossa gastronomia, essas pérolas do paladar. Quase onipresentes em nossas praças, esquinas e praias, esses incompreendidos pelos nossos órgãos governamentais de vigilância sanitária, por conta das condições de higiene em que são produzidos, bem como pela procedência obscura de suas matérias primas, merecem ser homenageados. Quando nossas autoridades perceberão que são exatamente os germes e bactérias presentes no processo que garantem o sabor inigualável dessas lendas de nossa cozinha? Tentem fazer igual em casa, e vocês perceberão que é impossível. Como diz o grande (em ambos os sentidos) Jô Soares: “o gosto do X-tudo da rua vem do germe da mão do cara que o faz”.

4) O dia internacional dos baixinhos, dos carecas, dos gordos e outros “pontos de referência” – esses desfavorecidos pela mãe natureza, sofredores condenados a atuarem como pontos de referência merecem. “Onde está seu irmão?”, um pergunta, “ali, ao lado do careca”, respondem. Ou então : “se ele alcançou aquela prateleira, então é fácil”. Ou ainda “quando você transa com sua mulher, ela goza duas vezes: uma no ato, e a outra quando você sai de cima”. Essas vítimas da sociedade mereciam até uma medalha, mas eu me contento com um dia dedicado à eles (na verdade a nós, porque eu me encaixo em um dos grupos). Nesse dia, não pagaríamos passagens de ônibus, nem entradas para o cinema, as mulheres seriam obrigadas a dar um beijo em pelo menos um representante dessas categorias, enfim, seria uma homenagem simples.

5) o dia internacional do Funk, do Pagode, do Axé e do Sertanejo Universitário DE QUALIDADE – esse já teria até data definida: seria todo dia 31 de fevereiro, mas apenas naqueles em que a temperatura média em Bangu – RJ fique abaixo dos 10 graus. Eu até propus que fizéssemos competições para saber quem seria capaz de encontrar o maior número de funks, pagodes, axés e sertanejos universitários de qualidade, mas todas as pessoas que entrevistei me disseram que seria muito mais fácil encontrar OVNIs, políticos honestos, enterros de anão e ex-gays.

6) o dia do heterossexual brasileiro – afinal, nós cinco merecemos uma data só nossa, vocês não concordam?

            Uma das muitas frustrações que trago na vida vem do fato de que, apesar de venerar o humor, e de tentar a todo tempo usá-lo como arma de críticas, jamais recebi uma única ameaça sequer de processo judicial. Xingamentos, difamações e outras maledicências já até encheram o saco, mas processos judiciais, que é bom, nem unzinho até agora! Sacanagem: todos os humoristas que admiro já foram processados por suas “vítimas”, e eu nunca fui. Que discriminação! Só porque eles são famosos? Na verdade, eu já até cheguei a sofrer uma ameaça de processo judicial por parte de um conhecido político da cidade onde eu morava, mas não foi por fazer humor. Foi apenas por dizer algumas verdades sobre ele. Algumas eram até engraçadas, mas a intenção não era fazer humor, eu juro pelo Paulo Maluf mortinho! Todavia, nesses tempos em que qualquer coisa que fuja um milímetro que seja de nosso “Catecismo do Politicamente Correto” pode terminar em confusão, me sinto na obrigação de lembrar que tudo o que eu disse nesse texto é apenas humor, apenas uma forma descontraída de criticar o fato de haver datas em homenagem a tudo, e das pessoas só pensarem e falarem disso nessas datas, como se fossem cãezinhos atendendo à voz de comando do adestrador. Inclusive, como já dito, eu mesmo faço parte de um dos tipos sobre os quais fiz humor (apelidos como “salva-vidas de aquário”, “c* de cobra”, “grande pequeno homem”, “gigante”, entre outros que acumulei ao longo da vida, sugerem que tipo seria esse).
            Enfim, espero apenas que me perdoem o meu senso de humor (menos os funkeiros).

quinta-feira, 7 de abril de 2011

PURO DESABAFO!!!

Voa, coração
Que ele não deve demorar
E tanta coisa a mais quero lhe oferecer
O brilho da paixão, pede a uma estrela pra emprestar
E traga junto a fé num novo amanhecer
Convida as luas cheia, minguante e crescente
E de onde se planta a paz,
Da paz quero a raiz

(da canção “Ao Que Vai Chegar”, de Toquinho e Mutinho)


            Mais uma vez eu tinha um texto filosófico pronto para postar no blog, e mais uma vez me senti na obrigação de adiar sua publicação para comentar um acontecimento lamentável ocorrido em nossa sociedade.
            Um ex-aluno de uma escola municipal do Rio de Janeiro passa com toda tranquilidade pelos portões de sua antiga escola, armado de dois revólveres e de farta munição. Uns afirmam que ele alegou ter ido lá buscar alguns documentos de seus tempos de aluno, outros que ele seria um palestrante. Nesse momento já notamos informações desencontradas, e breve as lendas se misturarão aos fatos verdadeiros, a estória irá povoar os jornais por algum tempo, talvez se torne filme, livro ou documentário no futuro, mas ao fim cairá no esquecimento, substituído pelos carnavais, Big-Brothers, novelas e Copas do Mundo da vida.
            Mas o fato é que esse ex-aluno entrou em uma sala de aula e começou a atirar contra os alunos, todos crianças, matando treze e ferindo outros vinte e tantos, alguns internados em estado grave, no momento em que escrevo essas linhas. Quase todos os tiros atingiram a cabeça ou o tórax das vítimas, dando a forte impressão de que o facínora sabia como manejar uma arma de fogo. Por diversas vezes, ele recarregou as armas. Por fim, com um tiro em sua própria cabeça, ele se matou.
            Uma carta foi escrita por ele, supostamente justificando o gesto insano. Segundo um oficial do Corpo de Bombeiros, o conteúdo da carta é extremamente confuso. Mais uma vez as lendas surgem por atacado: ele seria esquizofrênico, teria envolvimento com grupos fundamentalistas islâmicos, seria portador de HIV... e assim surge uma nova lenda urbana, e o que resta de fato é tão somente que diversas crianças tiveram suas vidas grotescamente ceifadas, e outras carregarão para o resto da vida um trauma que elas jamais irão esquecer.
            Não quero de modo algum fazer poesia sobre essa brutalidade, embora eu reconheça que as crianças vitimadas por essa insanidade mereçam ser homenageadas com poemas e canções de uma beleza que eu jamais poderia compor. E também não quero tentar nenhuma reflexão filosófica sobre o ocorrido, meu estômago revolvido de indignação e preplexidade não me permite. Quero apenas dizer que essas atrocidades são fruto de uma sociedade doente, uma sociedade que perdeu totalmente seus valores, se é que algum dia ela teve algum. Vou deixar você, meu amado leitor, com a revolta que deixei exposta através dos posts que fiz em um site de rede social, comentando um post de uma amiga:

            Uma sociedade que diz o quanto você vale pela quantidade de dinheiro que você tem, mesmo que seja dinheiro sujo, uma sociedade que diz que temos que competir sempre, sermos sempre os melhores, senão não somos nada na vida, ainda que para isso tenhamos que passar por cima dos outros..., uma sociedade que chama desonestidade de "esperteza", que chama compaixão de "fraqueza", uma sociedade que te diz que você é tão mais feliz quanto mais estiver imerso em bens de consumo..., uma sociedade que chama traficantes, políticos corruptos, bicheiros, entre outros, de "doutores", apenas por eles terem poder político e/ou econômico, enquanto dizem dos educadores: "você tem certeza de que quer ser apenas professor?" Como assim ser “apenas” professor? A mais bela de todas as profissões hoje é tratada assim? Uma sociedade em que as empresas se acham melhores porque lucram mais, e não porque seus produtos são bons, que se ufanam de acumular fortunas vendendo porcarias, essa sociedade não pode produzir nada melhor do que isso. Como diz uma canção de Gilberto Gil: "das feridas que a pobreza cria, sou o pus". Nossa sociedade está ferida, infeccionada. De vez em quando suas chagas se rompem, e o resultado é esse aí.
            Nós olhamos para quem comete essas atrocidades e pensamos: "esse cara é um monstro, é um doente", e muitas vezes não nos damos conta de que ele é a ponta de lança de toda uma sociedade que está doente. E não percebemos que nós também estamos um pouco doentes, porque nós fazemos parte dessa sociedade. É fácil demonizar um desvairado cuja atitude extrema vitimiza um monte de pessoas inocentes, mas cuja atitude é tão somente o clímax, o ponto alto, o espasmo, delírio ou vômito de uma sociedade que não suporta mais ser como é. Mas esse gesto insano só nos faz vermos isso com mais clareza, só faz deflagrar a situação de miséria, de falta de humanidade, em que vivemos. E infelizmente, quase sempre precisamos da existência de mártires para começarmos a refletir sobre isso. Nada trará as crianças vitimadas de volta. A perda é irreversível.

            Perdoem-me se por um momento estou abandonando minha linha de “filósofo da compaixão”, mas prefiro tentar evitar que minha revolta me faça sair por aí em desespero, à procura de culpados. Essas palavras não vieram de uma mente filosófica, do coração de um poeta, ou mesmo da alma de um crente em Deus. Elas vieram das entranhas de um ser humano que já não suporta mais ver tanta coisa acontecer diante dos olhos estupefatos do mundo. Peço a Deus para que qualquer acontecimento desse tipo continue provocando em mim mal-estares cada vez piores. Peço a Deus para que eu jamais me acostume com uma situação dessas. Se essas coisas pararem de me causar indignação, elas terão conseguido ceifar de mim a minha humanidade. Terão me transformado num monstro. Um monstro tão vil quanto este que, infelizmente, ganhou todas as manchetes dos jornais.