terça-feira, 26 de outubro de 2010

O Deus que Conheço


          
Eu iria falar sobre esse assunto mais tarde, mas uma postagem em meu blog, feita por um grande amigo e irmão, criticando o excesso de citações bíblicas de meus textos, me fez sentir a necessidade de publicar logo um artigo sobre os fundamentos de minha fé. Quando me afirmo cristão, de modo algum estou me identificando com as pessoas que abarrotam nossas igrejas, sejam elas católicas ou protestantes. Sou cristão principalmente por buscar orientar minha vida pelo exemplo ético e prático de Jesus. A Bíblia e a Igreja para mim, só têm validade na medida em que falam de Cristo. E nesse ponto, devo esclarecer duas coisas: a Bíblia fala de Jesus, mas não o faz o tempo todo, o cristão de verdade deve buscar a Jesus dentro da Bíblia. E as igrejas há muito deixaram de pregar a Jesus, para pregar a si mesmas. Mas então quais seriam as bases de minha fé? Tudo começa no Evangelho de João, onde lemos: “no princípio era o Verbo”. A palavra “verbo” é tradução do grego “logos”, e seu significado literal é “palavra”, “discurso”. Vejo até um certo valor na tradução “verbo”, por ser essa a classe de palavras que representa ação, movimento. O Logos, portanto, seria a Palavra de Deus posta em movimento. Mas em minha opinião, há uma interpretação mais profunda para esse termo: o Evangelho de João foi escrito para uma comunidade grega, familiarizada com a filosofia de Aristóteles, para quem a matéria que compõe o universo sempre existiu, mas era uma massa disforme, desordenada, chamada por ele de Caos. O Logos seria o princípio ordenador do universo, que lhe deu forma, ordem e inteligibilidade, transformando o Caos em Cosmos. O autor do Evangelho de João afirma ser Jesus o Logos divino encarnado, feito imagem e semelhança do homem.
No discurso proferido em Atenas, registrado no livro dos Atos dos Apóstolos, na Bíblia, Paulo afirma que em Deus nós vivemos, nos movemos e existimos. Ou seja, Deus não apenas criou, mas mantém constantemente o universo, do contrário todo o Cosmo se aniquilaria, se desintegraria. A Teologia Cristã chama isso de Providência Divina, e tanto a Bíblia quanto a filosofia aristotélica dizem também ser o Logos o responsável pela manutenção do Cosmo. E como o Logos também conferiu inteligibilidade ao Cosmo, é possível ao homem não só viver, mas conhecer e ver sentido no universo.
O alicerce de minha fé é esse: o Logos Divino perpassa toda a Criação, e se manifesta o tempo todo aos homens, em maior ou menor grau (algo como a idéia da “Força”, das trilogias cinematográficas de Star Wars). E em Jesus de Nazaré, o Logos ganha sua expressão máxima no mundo. Sendo assim, toda a mensagem de Jesus já havia sido dada,  de forma embrionária e/ou fragmentária, em outros contextos. Não há um único ensinamento de Jesus que não esteja presente em outras religiões, e o mesmo Logos transmite esses ensinamentos a todas elas. Não me interessa então os detalhes teológicos do Cristianismo, nem suas tradições e rituais, a não ser quando estou pensando Teologia Cristã. Interessa-me apenas estar diante das mais variadas situações e me perguntar: “que faria Jesus numa situação dessas?”, “que significado isso teria para Jesus?”. E aí descubro que o grande mandamento de Cristo foi apenas que amássemos a Deus sobre todas as coisas, e ao próximo como a nós mesmos. Mas isso também é dito no Budismo, no Islamismo, nas religiões espíritas, enfim, em todas as religiões. Para isso só precisamos procurar nas religiões aquilo que elas têm de melhor, sua essência, e não a tinta com a qual os líderes religiosos a pintaram ao longo dos séculos.
Mas se o Logos está presente em toda parte, por que razão sou cristão, e não de nenhuma outra religião? Por que creio eu ser Jesus, e não qualquer outro, a expressão máxima do Logos, do amor de Deus, no mundo? Essa pergunta não possui nenhuma resposta racional. Jesus simplesmente fala ao meu coração como nenhum outro. Mas lembrem-se: estou falando de Jesus, e não da letra fria e morta da Bíblia, e muito menos das instituições corruptas que advogam para si a posse exclusiva da divindade, e se autodenominam injustamente de “Igreja”. Igreja de verdade é toda reunião de dois ou mais em nome de Jesus (em nome do Logos, na verdade), e não em nome de si mesmos. Caio Fábio costuma dizer que a Bíblia lida sem Jesus torna-se a mãe de todas as heresias, e eu completaria dizendo que a Igreja sem Jesus é simplesmente “Sinagoga de Satanás” (não creio que o Diabo exista, mas uma igreja sem Jesus – e praticamente todas elas o são – é o mais próximo que consigo pensar do Coisa-Ruim).
Assim, eu afirmo: toda pessoa que busca de forma sincera vai encontrar a Deus, independente da religião pela qual ela irá empreender essa busca. Na verdade, Deus é quem irá encontrá-la, através de seu Verbo. Minha opção por Cristo vem do fato Dele, mais do que qualquer outro, falar ao meu coração. Essa opção é motivada unicamente pela fé. E esta é definida na própria Bíblia como a confiança em coisas que não podemos provar. Creio que todas as pessoas serão reconciliadas por Deus. Creio que essa reconciliação é dada por meio do Logos, e apenas através Dele. Creio que Jesus é a suprema revelação do Logos ao homem, mesmo não sendo a única. O budista não será “salvo” por seu budismo, nem o espírita por seu espiritismo, e muito menos o cristão o será por seu cristianismo. O ser humano fará as pazes com Deus através do Logos, que criou e mantém o universo, e um dia se fez homem para nos dizer: “o Reino de Deus já está entre vós”, e para nos admoestar: “amai-vos uns aos outros”. Todos serão salvos por Jesus, e a religião é o que menos importa.
Não deve haver, portanto, nenhum estranhamento no fato de eu fazer constantemente citações bíblicas. Afinal, trata-se da fonte de onde extraio minha orientação de fé. Apenas preciso deixar claro uma coisa: eu não advogo a famosa inerrância da Bíblia. Não creio nela como um livro divinamente inspirado em sua totalidade, isento de erros do primeiro ao último caracter. A Bíblia para mim não é a Palavra de Deus, ela apenas contém a Palavra de Deus. A Palavra de Deus é a mensagem trazida a nós por Jesus, e o texto bíblico é tão somente o código através do qual essa mensagem foi passada. E o dever do verdadeiro cristão é justamente extrair a Palavra de Deus da Bíblia.
Os teólogos costumam usar uma ferramenta de interpretação chamada “chave hermenêutica”, que é um conceito a partir do qual se faz a interpretação de todos os outros. Para mim, faço novamente coro com as palavras de Caio Fábio, e afirmo que a única chave hermenêutica válida para interpretar a Bíblia é Jesus Cristo. Quanto mais um texto se parece com Jesus, mais ele é “divinamente inspirado”, sendo o contrário também verdadeiro.
Essa é, de forma bem sucinta, a base de minha fé.