quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Por que continuar lutando por um mundo melhor?








            “Certa vez um viajante, passando por uma cidade, viu um homem no meio da praça, de pé sobre um caixote de madeira, proferindo um discurso inflamado, no qual ele conclamava o povo a uma mudança de atitude. Apesar da beleza do discurso e das palavras sábias e justas do homem, ninguém lhe dava a menor atenção.
            No ano seguinte, de volta à cidade, o viajante se deparou com a mesma cena: o homem discursando inflamadamente no meio da praça, sobre um caixote de madeira, e os transeuntes em volta agindo simplesmente como se ele não existisse. E assim foi no ano seguinte, no outro, e em muitos mais, até que o viajante, não mais contendo a curiosidade, dirigiu-se ao homem e lhe disse:
             – Amigo, há anos passo por essa cidade, e o vejo aí na praça, sobre esse caixote de madeira, discursando, conclamando o povo a uma mudança de atitude. Percebo como são belas as suas palavras, e como são justas e corretas as suas admoestações. Mas percebo também que, apesar de sua obstinação, absolutamente ninguém nessa cidade lhe dá ouvidos. Pergunto-lhe eu: por que você continua discursando? Por que você não desiste, já que está mais do que claro que você não vai conseguir convencer ninguém?
            O homem desceu calmamente do caixote de madeira, fitou o viajante por um longo tempo e, após deixar escapar um tímido sorriso, disse:
             – Não posso desistir. Porque se eu desistir, ELES É QUE TERÃO CONSEGUIDO ME CONVENCER.”
           

A história acima foi contada anos atrás, num comercial de TV da Campanha Contra a Fome, do saudoso Betinho. Narrada na ocasião por Caetano Veloso, aqui eu a reproduzo não exatamente como no texto do comercial, mas com minhas próprias palavras.
Eis a razão por que continuo a defender minhas idéias e os valores nos quais acredito, mesmo sabendo estar remando contra a maré, mesmo diante da total falta de perspectiva de qualquer mudança a curto prazo. Talvez as mudanças por mim buscadas só venham a se tornar realidade para meus bisnetos, ou talvez elas jamais venham a acontecer. Mas o sonho da mudança é como uma árvore, cujas sementes plantamos hoje, mas cujos frutos só poderão ser colhidos num futuro distante.
Não importa quanto tempo leve para que as mudanças de verdade aconteçam: alguém precisa plantar as sementes, o mais rápido possível. As futuras gerações agradecerão por isso.

Mais um pouco de poesia.


DECLARAÇÃO

Se de meus olhos brotasse o testemunho
Que vai ao chão a regar a fina flor
Última Flor do Lácio Inculta e Bela*
Pela qual meu ser anela
Merecer o seu amor

Seria nada mais além do vão martírio
O delírio derradeiro de um poeta
Tal qual ave que voa através do vento
Com o mais sublime intento
De nunca atingir a meta

Ainda assim deliraria de alegria
Por ter sido trovador de tal encanto
Ter nos olhos meu poema refletido
Coração, mesmo partido
Traz a graça de um pranto


* alusão ao soneto "Língua Portuguesa", de Olavo Bilac.